Empresas vendem dados de Bolsonaro
Em mais de quatro meses de investigação, o repórter Pablo Fernandez, da BandNews FM, revela um grande esquema de venda de dados pessoais extraídos do INSS, das Forças Armadas e do serviço federal. Nem mesmo as informações de autoridades, como o presidente Jair Bolsonaro e o ministro Sérgio Moro, estão protegidas.
O caminho é o mercado de call center. São número de telefones, celulares ou fixos, CPF, RG, endereços, dados bancários, salário e informações de parentes. Tudo isso é negociado diariamente por sites que são utilizados, na maioria das vezes, por empresas de telemarketing.
Pelo Hotfone, nome dado aos sistemas que permitem a consulta de dados pessoais, é possível encontrar qualquer pessoa. Parte das páginas, no entanto, sequer aparece nas buscas do Google, para não levantar suspeitas. Por meio de grupos no WhastApp, a BandNews FM identificou pelo menos oito sistemas.
A maioria tem informações colhidas em servidores utilizados pelo INSS, Forças Armadas ou serviço federal; alguns têm um banco de dados próprio e não está claro como são abastecidos. O preço varia conforme o tipo de pacote. Há sites com planos mensais, que podem custar entre R$ 75 e R$ 100.
Há a possibilidade de comprar um número fechado de consultas, como mostra a negociação feita com uma mulher do site Consulta Mais: “Eu tenho quantidade de 1.000 consultas, 5.000 ou 10.000. Você compra 1.000 consultas, eu vou te depositar 1.000 consultas no seu usuário e você vai usar as 1.000 consultas até elas esgotarem".
Além do Consulta Mais, a BandNews FM chegou aos sites Multibr, Hotfone, ADV Gestor, Unitfour, 3C Sistemas e Assertiva, com a qual também entrou em contato. “A gente traz para você telefone celulares e fixos, endereços, e-mails, pessoas relacionadas, participação em empresas e lugares onde você trabalhou", dizem.
O esquema de venda de dados sigilosos é alvo de uma investigação aberta no ano passado pela Polícia Federal. Mas a operação denominada Data Leak chegou a apenas dois dos oito sistemas descobertos pela BandNews FM. Um dos chefes do esquema, Eledovino Basseto Júnior, chegou a ser preso, mas foi solto e voltou ao mercado.
Ele controla os sites Hotfone e Multibr. “Cara, o Hotfone é basicamente para localizar telefone e endereço. Você tem a busca a partir do CPF, do benefício ou do nome, mas se limita a trazer informação sobre os endereços e telefones. É bem específico. Ele responde para qualquer CPF”.
Nos sites controlados por Eledovino, a BandNews FM fez buscas e obteve acesso a informações do presidente Jair Bolsonaro, do vice Hamilton Mourão e do ministro da Justiça Sérgio Moro. Christiane Edington, presidente do Dataprev, responsável por guardar os dados do INSS, diz que a denúncia será investigada.
Um dos alvos da primeira fase da Operação Data Leak, a Datweb, responsável pelo site ADV Gestor, nega a venda de qualquer informação sigilosa e diz que o sistema foi criado para automatizar as atividades desempenhadas por correspondentes bancários.
A 3C Sistemas ressalta que está melhorando o controle de acesso ao próprio sistema e que, ao contrário do que diz a reportagem, atua no gerenciamento e não na venda de informações, apesar de a BandNews FM ter feito consultas de dados pessoais.
Em nota, a Assertiva nega qualquer irregularidade, tendo um banco de dados próprio, e diz que atua no segmento de proteção ao crédito, assessorando os clientes com informações “não sensíveis”, “públicas” e estritamente essenciais ao mercado, cumprindo a legislação em vigor.
A empresa afirma ainda que o acesso a qualquer serviço é realizado apenas após prévia análise cadastral para evitar o uso indevido de qualquer informação e diz que reportagens como a da BandNews FM permitem diferenciar quem atua ou não dentro da lei.
A Unitfour, por sua vez, afirma que seu banco de dados é proveniente de fontes públicas, ações promocionais, parcerias, cadastros online e mídias sociais; diz ainda que cumpre a legislação em vigor. A Viper foi procurada pela BandNews FM, mas não conseguiu contato.