Vítimas contam a angústia e o peso psicológico
da Covid-19 e as reações quando foram infectados. É o relato da via crucis e algumas sequelas de quem teve covid-19 se recuperou. São marcas profundas de insegurança, medo, ansiedade, e também o pedido de ajuda por meio da fé em Deus para tentar esquecer, ou ao menos conviver, com a sombra do passado.
Quem bem sabe disse é o locutor Paulo Vicente, da Morena FM, testado positivo no início deste ano, que conversou com a jornalista Rosi Barreto. Ele chegou a ser internado na UTI, se recuperou, mas guarda lembranças que gostaria de esquecer. O mecânico João Canaverde, também.
Paulo Vicente conta que estava trabalhando numa reforma em sua casa quando começou a sentir os primeiros sintomas, como tosse seca, irritabilidade na garganta, estresse e febre. Após consulta e alguns exames, a pneumologista disse que “estava batendo na trave”, com oxigenação baixa.
Vendo a morte ao lado
Dois dias depois, outros exames e a ida ao hospital. Uma tomografia revelou que ele estava com 75% dos pulmões comprometidos. “Não cheguei a ter falta de ar, mas tinha a respiração pesada”, conta. Paulo ficou um dia na enfermaria, aguardando vaga na UTI.
Ela surgiu no dia seguinte, com a morte de um entre muitos pacientes vitimas da doença. Consciente nos quatro dias em que ficou na unidade de tratamento intensivo, sob forte medicação e oxigênio forçado, Paulo viu pacientes morrendo ao seu lado.
Segundo ele, outro paciente, ainda lúcido, deu entrada e no dia seguinte pediu socorro, mas já estava morrendo. “A sensação que tive era de que eu não estava ali, o pensamento era vago, alheio a tudo ao redor”. Diz que não pensava na morte, mas também não tinha perspectiva de vida.
Sentindo a vida
Quando saiu do hospital, oito dias depois, Paulo pediu à família para ir à praia. “Eu precisava ver a vida e foi uma sensação maravilhosa sentir a areia nos pés, o vento, o mar”. Quase oito meses após sua recuperação, ele diz que sente dores que mudam de lugar o tempo todo.
Também sente insônia, fraqueza, olhar fixo em nada, sensação de solidão, além de muita fome e desejo de comer acarajé. Diz que é estranho porque nunca teve esse desejo desenfreado. Para ele, covid significa separação da família, dos amigos e da vida.
Já o mecânico João Canaverde, de 72 anos, não chegou a ser internado, mas sentiu "a vida o deixando lentamente". Sem olfato, sem gosto pela comida, mal estar e febre alta diária, temia morrer. João melhorou, mas a mulher diz que entre as poucas sequelas, ficou o desejo de comer muito.
Muito esforço foi feito para produzir estas notícias. Faça uma doação para repor nossas energias. Qualquer valor é bem vindo.